É grande o movimento de migração do suporte papel para o digital em vários setores da economia. Esse processo percorre quase sempre o mesmo caminho, ou seja, empresas e órgãos públicos se voltam para os volumosos acervos em papel, muitos deles em franco processo de deterioração.
Mesmo o Judiciário, considerado um dos mais conservadores poderes da República, avança na digitalização dos diários oficiais. São Paulo digitalizou 117 anos de publicações mensais que abarrotavam salas e estantes de suas instalações, com um custo aproximado de R$ 10 milhões. E pretende disponibilizá-las na internet. Este importante acervo, que além de espelhar a própria existência do Judiciário daquele Estado, conta com documentos de alto valor histórico, como a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 24 de fevereiro de 1924.
Os quase 200 anos do DOU (Diário Oficial da União) também serão transformados em bits. Este é um processo que, além da tecnologia, implica em criterioso trabalho de seleção, manipulação e indexação dos conteúdos. Esta é a parte mais cara e sensível, pois depende de mão-de-obra especializada.
A digitalização propriamente dita é facilitada por modernos scanners, que a cada dia surgem com performances mais estonteantes. Por esse processo, uma fonte de luz é projetada no documento refletindo seus tons, para posteriormente serem convertidos por um sensor de luz em descargas elétricas, que por sua vez serão convertidas em formato digital. A partir daí temos os chamados bitmaps (mapas de bits), que são representações compostas de linhas e pontos de uma imagem gráfica.
Depois disto temos “apenas” milhares de imagens, pois o processo de digitalização produz arquivos estáticos, como se fossem fotos daquelas páginas. Isso significa que, para encontrar uma informação, é preciso “rolar” as imagens na tela do computador até encontrar a procurada.
Por este motivo, foram criados softwares que transformam as imagens em linguagem escrita digital, um recurso fundamental para a rápida localização de um texto, por exemplo, por assunto, nome, data etc. Esses programas, conhecidos como OCR (Optical Caracter Recognize), lêem as imagens e as transformam em textos, permitindo que o computador encontre o assunto desejado por palavras, porque, aí sim, a máquina lê o conteúdo. Este software permite até interferências no texto.
Esta transformação caminha a largos passos também com livros. Bibliotecas inteiras estão sendo copiadas pelo Google, mesmo sob processos judiciais das editoras. Estima-se que esta empresa esteja digitalizando cerca de 10 milhões de livros por ano. Apenas o contrato com a Universidade de Berkeley, nos EUA, prevê a digitalização diária de 3 mil livros.
Uma organização sem fins lucrativos, chamada The Internet Archive, quer criar uma espécie de biblioteca de Alexandria com todos os textos e vídeos de domínio público. Para leitura deste material surgem pequenos aparelhos do tamanho de um livro comum, compostos por telas que reproduzem as imagens digitalizadas, ou já produzidas em formato digital.
Diante disto, é inevitável filosofar sobre como as pessoas vão ler no futuro, e se o papel vai acabar. E mesmo sobre o que serão os livros no futuro, na medida em que os conteúdos estarão interligados e possibilitarão interatividade com fotos e vídeos. O que seriam as atuais notas de pé de página, nos levarão à exaustão da informação específica sobre aquele assunto.
Os dicionários já estão sofrendo sensível redução de vendas, pois as versões digitais apresentam-se muito mais baratas, e algumas até são gratuitas, como a Wikipédia. Ao que tudo indica, todos os livros técnicos terão este inexorável fim. Ou seria começo?
Romances e ficções a princípio estariam livres, pois apresentam-se mais como lazer. Portanto, quando não queremos ser interrompidos – mesmo que por notas de rodapé. Por isso, queremos crer que nosso sagrado sossego da leitura descompromissada ainda será no papel… Além do banheiro é claro!
Tabelião de Notas em Curitiba, [email protected], escreve todas as segundas nesse espaço. www.jornaldoestado.com.br
Fonte: Angelo Volpi Neto.