Patricia Ferraz: “há uma onda crescente e virtuosa em favor da regularização fundiária”

Patricia Ferraz, registradora de Diadema, SP, e diretora de Assuntos Legislativos e de Regularização Fundiária e Urbanismo do Irib, destacou em sua apresentação os benefícios da regularização fundiária urbana, desde a capacitação econômica das pessoas e sua inclusão social na economia formal até a diminuição da violência. Para ela, o cenário e as perspectivas dessa realidade podem ser vistos de duas formas: uma mais otimista e outra mais pessimista. Começando pela pessimista, ela disse estar preocupada com a inclusão de um artigo da MP 335 que instituiu gratuidade indiscriminada do registro do primeiro título de aquisição de direito real na regularização fundiária de interesse social.

“Se considerarmos que 90% da população está nessa faixa de renda, vamos perceber que o legislador federal está impondo um ônus extremamente pesado para o registrador de imóveis sem uma contrapartida pelo serviço prestado. Isso me preocupa porque acredito que possa ser um empecilho e um obstáculo à regularização fundiária. Não é possível esperar que qualquer procedimento, seja de regularização fundiária ou qualquer outro de implementação de política pública, seja implementado com sucesso sem que os demais participantes tenham ou recebam uma contrapartida pelos trabalhos que desempenham”, comentou.

A diretora do Irib relatou que há alguns anos o Instituto vem desenvolvendo intenso trabalho de conscientização e inserção dos registradores de imóveis e dos notários nos processos de regularização fundiária. No entanto, é muito difícil dizer a esses profissionais que eles nada vão receber por um trabalho jurídico extremamente complexo. “Isso me faz olhar para a questão da regularização fundiária de modo mais pessimista”, lamentou.

Agora resta esperar que o Senado tenha condições de descartar essa inovação legislativa que a registradora considera extremamente danosa, uma vez que não existe gratuidade de fato. “Instituiu-se a gratuidade do registro civil na Lei de Registros Públicos e o que vemos em todo o Brasil é o custeio pelos cidadãos, ou seja, os usuários dos outros serviços cartoriais pagam a mais para custear a gratuidade do registro civil. Da mesma forma, não existe a gratuidade da chamada Justiça gratuita. No estado de São Paulo, um percentual muito alto dos valores que são gastos com registros, tabelionatos de notas e protestos, registro de títulos e documentos e de pessoas jurídicas vai para o custeio da Justiça gratuita. Portanto, não existe gratuidade. A questão é como remunerar o registrador, que é parte importantíssima desse processo. Como ele poderá trabalhar arduamente, pagar funcionários especializados e capacitados, além das demais despesas, sem receber nada por isso? Isso simplesmente inviabiliza a prestação dos serviços, acredito que esse tipo de imposição se deva ao desconhecimento de como funciona o registro de imóveis. As pessoas imaginam que o registro de imóveis é bancado pelo Estado e que o registrador recebe para si tudo o que é pago pelos usuários do serviço. Na verdade, os valores recebidos pelo registrador são distribuídos para o custeio da atividade, para o repasse de custas ao Estado, e o que sobrar fica para o registrador que ainda paga imposto de renda sobre isso. Acho que às vezes não se tem essa percepção e me preocupa o legislativo ter tratado dessa forma essa questão.”

Em sua palestra, Patricia Ferraz comentou que se tornou comum dizer que o processo de regularização fundiária é inviabilizado pelo custo do registro. Para demonstrar que a afirmação é infundada, levantou o custo do registro de uma regularização fundiária no estado do Espírito Santo para 1.800 famílias. “Sairia algo em torno de 20 mil reais. Um profissional da prefeitura de Vitória relatou que a prefeitura gasta mais de 200 mil reais somente com o plano de levantamento, para pagar arquitetos, engenheiros e cadastro, entre outras coisas. Portanto, o custo do registro não pode ser considerado elevado para a regularização. Todos os interlocutores com os quais tratamos nos últimos anos foram sensíveis às razões que levantamos para a impossibilidade do estabelecimento de um sistema de gratuidade. Um empresário, ou mesmo um administrador público sabe que os serviços precisam ser remunerados ou ficarão inviabilizados”, explicou.

Contudo, a diretora do Irib reconhece que o enfrentamento dessa questão é difícil. “Mas se os registradores não expuserem suas dificuldades, a importância do seu trabalho e o funcionamento do registro de imóveis, quem o fará?”, perguntou. “É importante reconhecer o forte preconceito que existe com relação à atividade. Em São Paulo vejo condições mais favoráveis para a regularização fundiária porque temos um governador que está preocupado com essa questão e seu secretário de Habitação, Lair Krähenbühl, que vem da iniciativa privada, é um homem vinculado à regularização fundiária. Em 2002, ele fez um trabalho espetacular de regularização fundiária. É importante que se diga que o secretário Lair Krähenbühl cuidou de muitas questões que estão no projeto 22/07, antigo PL 3.057. Muitas dessas propostas do PL 3.057 já estavam previstas no trabalho de Lair Krähenbühl, portanto ele sabe o que está fazendo e o que precisa ser feito”.

Sob o ponto de vista do poder Judiciário, Patricia Ferraz referiu que o Irib está encaminhando uma proposta à Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo sobre uma modificação das normas de serviços, no que diz respeito à regularização fundiária. “Essa é uma proposta consolidada a partir de sugestões colhidas em audiência pública promovida pelo Irib no último dia 2 de fevereiro, em São Paulo, SP, com a participação de mais de duzentas pessoas, e de outras sugestões que nos foram encaminhadas posteriormente, além de sugestões de vários registradores que trabalham com a questão da regularização fundiária e que entendem muito de registros públicos, como João Baptista Galhardo, Ademar Fioranelli, Flauzilino Araújo dos Santos, George Takeda, e tantos outros. A realização dessa audiência pública foi um marco na história do estado de São Paulo não só por ter sido realizada pelo Irib, como também pelo número e pela expressão das pessoas que lá estiveram, por exemplo, o próprio secretário de Habitação, o corregedor-geral da Justiça, vereadores, representantes de administrações municipais, diversos secretários municipais da habitação, representantes de deputados federais, estaduais, o que mostra uma grande frente de pessoas voltadas para a regularização fundiária, com condições de produzir bons resultados. Sobre esse aspecto, fico tranqüila. Fico tranqüila também porque o Irib e a Arisp têm desenvolvido trabalhos no estado de São Paulo voltados para a capacitação dos registradores e envolvimento deles nos processos de regularização fundiária. Essa é a perspectiva positiva a que me referi no início, uma onda crescente e virtuosa em favor da regularização fundiária”, finalizou.

 

Fonte: Irib.

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